sexta-feira, 25 de março de 2011

Ficha limpa: quando o ativismo judicial atropela a democracia


Por 6 votos contra 5 o Supremo Tribunal Federal derrubou os efeitos da Lei da Ficha Limpa para o pleito eleitoral de 2010. Se a decisão ficou empatada no STF por vários meses, só vindo ao desempate com a chegada do 11° ministro, Luiz Fux, está nítido que o resultado passou longe da sua pacificação material.
Estou entre os brasileiros frustrados com a decisão do STF. Estou entre aqueles que viram mais coerência nos votos dos cinco ministros – Carmen Lúcia; Ricardo Lewandowski; Joaquim Barbosa; Ayres Britto e Ellen Gracie, que entenderam que a lei em julgamento, via caso concreto de um candidato a deputado, deveria valer para 2010. Os argumentos dos cinco ministros cercaram sua tese de legalidade, legitimidade e moralidade.
Carmen Lúcia deixou claro que o princípio da anualidade, base do voto do ministro Luiz Fux, tem o objetivo doutrinário de evitar casuísmos que prejudiquem a isonomia nos pleitos eleitorais, logo, na medida em que as convenções partidárias são o momento em que as candidaturas tomam forma jurídica, e que neste momento, das convenções de 2010, a lei já existia, pode-se falar tranquilamente em constitucionalidade.

Ricardo Lewandowski, que é presidente do TSE, percorreu caminho semelhante ao de Carmen Lúcia, ao afirmar que o princípio da anualidade busca garantir a “paridade de armas” entre os que disputam o pleito, paridade que não foi alterada em 2010 com a Lei da Ficha Limpa. Ellen Gracie foi além, e argumentou que inelegibilidade nem é ato e nem fato jurídico no processo eleitoral, mas questão de indiscutível estatura constitucional, pois a probidade administrativa é exigência da lei maior.

Os ministros Joaquim Barbosa e Ayres Britto destacaram aspectos mais políticos da decisão, mas, nem por isso, menos importantes. Ayres Britto reivindicou a importância da soberania popular, sobretudo em matéria de direitos políticos, visto que a Lei da Ficha Limpa foi originária de projeto de iniciativa popular. Reivindicou ainda que a interpretação da Constituição deve sempre perseguir o combate à corrupção administrativa no país, corrupção esta que se encontra de tal ordem que a própria sociedade levantou-se de forma organizada para buscar encaminhar soluções.
Joaquim Barbosa afirmou categoricamente que o STF estava diante de uma decisão política, pois estava frente a duas questões constitucionais, e sendo assim, haveria de se fazer a opção pela moralidade pública, segundo ele, uma das chagas da vida política do país.
Mas, por maioria de um único voto, o STF derrubou a Lei da Ficha Limpa para 2010. A tese vencedora apegou-se a aspectos supostamente “técnicos” do direito, aspectos supostamente formais. Segundo estes, o artigo 16 da Constituição Federal exige o princípio da anualidade que, se ferido, atingiria outros princípios, como o da segurança jurídica. Uma interpretação exageradamente gramatical e, pior, contraditória com o próprio histórico de decisões do STF.
Só para ficar num único exemplo, o STF não formou maioria para defender o direito adquirido dos aposentados, quando da reforma da previdência. O STF julgou ser constitucional taxar aposentados e pensionistas que já se encontravam nesta condição há anos. Houve, neste caso, uma quebra gravíssima do princípio da segurança jurídica.
A argumentação dos que formaram maioria, a partir de relatório do ministro Gilmar Mendes, buscou trazer também para o seu campo um elemento subjetivo de coragem e heroísmo, buscando deixar os demais ministros no quadrado da acomodação fácil aos apelos populares. “O STF deve guardar a Constituição, mesmo contra a turba leiga que se arvora a fazer justiça a partir das ruas e mesmo contra um legislativo incompetente”, eis a mensagem subliminar (nem tanto) facilmente captada no conjunto dos votos majoritários, sobretudo o do relator. O ativismo judicial em sua face mais triunfalista, e trágica.

Neste caso concreto, a maioria do STF não esteve à altura da interpretação da Constituição. Não levaram em conta o esforço necessário para se apresentar um projeto de iniciativa popular no Brasil, que é praticamente o mesmo desprendido para se fundar um partido político. Não levaram em conta que a Constituição não é um mero pedaço de papel onde estão inscritas normas frias.
Enfim, não levaram em conta que estavam, no fundo, julgando que a sociedade, organizada, através da CNBB, OAB, ONGs, ABI, parlamentares, Conselhos Profissionais, entidades sindicais trabalhistas e empresariais, movimentos estudantis, ambientalistas – tudo muito diferente de uma turba de leigos -, bateu às portas do STF, exigindo o cumprimento dos princípios que norteiam a nossa Constituição. Lamentavelmente, os ministros da maioria, não por coragem ou heroísmo, mas por muita vaidade talvez, não foram minimamente razoáveis em suas decisões, aliás, razoabilidade é um princípio indispensável quando se trata de fazer justiça.

Edilson Silva-Presidente do PSOL-PE

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quinta-feira, 24 de março de 2011

Queda da Lei da Ficha Limpa para as eleições de 2010 reforça a política econômica neoliberal



Ontem (23/3/2011), o novo Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux desempatou a votação sobre a validade da “Lei da Ficha Limpa” para as eleições de 2010, liberando os “fichas-sujas” para assumirem cargos públicos. Assim, esta Lei somente começará a valer nas eleições de 2012.

Como consequência, a Senadora Marinor Brito (PSOL/PA) pode perder o mandato para o senador Jader Barbalho (PMDB/PA), que renunciou a seu mandato de senador em 2001 para escapar da cassação. Desta forma, a base do governo no Senado – que já possui mais de 3/5 dos senadores, conforme mostrou a votação do salário mínimo de apenas R$ 545 - fica ainda mais forte. Marinor votou por um aumento substancial do salário mínimo, enquanto Jader reforçará a base governista, votando com a orientação da Presidente Dilma.

Outro exemplo de como a decisão de Fux prejudicará o combate às políticas neoliberais ocorreu na terça feira (22/3), na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, que realizou Audiência Pública com o Presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, para falar sobre as políticas monetária e cambial.

Tombini defendeu a política de juros altos, com o argumento de que isto seria necessário para se reduzir a demanda e assim controlar a inflação. A Senadora Marinor questionou este argumento, mostrando que a inflação brasileira tem sido causada pelos preços administrados pelo próprio governo, a exemplo do aumento dos ônibus, contra o qual houve grande luta da população em várias cidades, como Belém e São Paulo.

Outra causa da inflação é a alta dos alimentos, devido a problemas de oferta de produtos, o que também não se resolve com alta de juros, mas com uma ampla reforma agrária e outras políticas que garantam alimento a toda a população brasileira.

Tombini argumentou que a alta de juros serviria para impedir que a alta destes preços seja repassada para os demais setores econômicos. Porém, mesmo que isso seja verdade, seria ainda mais um motivo para o governo reduzir os preços administrados e dos alimentos, executando políticas de segurança alimentar capazes de modificar o atual sistema agrícola brasileiro, ao invés de aumentar os juros.

A Senadora Marinor também questionou Tombini sobre o Banco Central promover reuniões períódicas com supostos "analistas independentes" para elaborar estimativas de variáveis como inflação, crescimento e juros, sendo que quase 90% dos participantes destas reuniões representam bancos ou fundos de investimento. Conforme mostraram os trabalhos da recente CPI da Dívida na Câmara dos Deputados, o próprio Banco Central reconheceu que estas estimativas são utilizadas no "Relatório de Inflação", que por sua vez orienta a decisão do COPOM (Comitê de Política Monetária) sobre a taxa de juros.

Portanto, o BC utiliza estimativas feitas pelos rentistas para orientar sua decisão sobre a Taxa de Juros, que beneficia os próprios rentistas. A edição de 23/3 do jornal Estado de São Paulo divulgou que a Senadora Marinor “comparou a coleta de dados do BC no mercado financeiro a "colocar a raposa no galinheiro".

Tombini respondeu que tais instituições são muito competentes em suas previsões, sendo que as cinco melhores ainda são classificadas como “Instituições Top 5”.

Ou seja, em bom português: os bancos estimam a taxa de juros, o Banco Central atende a estas estimativas, e estas instituições financeiras ainda são agraciadas com o prêmio “Top 5”.

Rodrigo Ávila-Economista